O artigo publicado é de 12 de junho da coluna
no jornal O Estado de S. Paulo, intitula-se "Vexame Ambiental". A relação completa das
publicações pode ser encontrada em www.xicograziano.com.br
Receba um abraço
do,Xico Graziano
Que Código Florestal, nada. O
grande fiasco brasileiro na Rio+20 se esconde no etanol. O país que ensinou ao
mundo como trocar a gasolina fóssil pelo álcool renovável engata marcha ré na
utilização do combustível limpo. Um vexame ambiental.
Pode-se comprovar facilmente
esse retrocesso na bioenergia. Em 2011, o consumo dos combustíveis derivados de
petróleo - gasolina principalmente - cresceu 19%, enquanto o uso do etanol nos
veículos despencou 29%. Não precisa dizer mais nada. Anda na contramão da
história a matriz energética dos transportes no Brasil.
Aconteceu que os consumidores
reagiram ao desequilíbrio de preços a favor da gasolina. Duas razões básicas
explicam a mudança do mercado. Primeiro, o governo federal tem reduzido o
encargo da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre a
gasolina, taxa que nos últimos anos recuou de 14% para 2,6%. Em consequência,
acabaram praticamente equiparados os custos tributários de ambos os
combustíveis. Uma política moderna de sustentabilidade, como buscada em todo o
mundo, procederia ao contrário, ou seja, reduziria a carga tributária sobre o
biocombustível, não sobre o derivado de petróleo.
Trata-se, obviamente, de uma
decisão política, arcada pelo governo federal desde 2002. Com a redução da
referida taxa, a Petrobrás, que normalmente deveria ter elevado o preço dos
derivados de petróleo para manter sua competitividade global, se compensa pela
perda de rentabilidade recolhendo menos imposto ao governo. Tudo dissimulado.
Conta paga pela sociedade.
Em segundo lugar, a gasolina
barata segura, obviamente, o preço do etanol na bomba, roubando margem dos
produtores. Pouco lucrativa, a atividade alcooleira vê sua matéria-prima se
direcionar para a fabricação de açúcar, movimento que se observa há tempos nas
usinas. Bastante rentável no mercado internacional, o açúcar estimula a pauta
das exportações. Resultado: a oferta de etanol se retrai, tendendo a elevar seu
preço no posto de combustível, espantando a freguesia.
Elementar.
O Brasil produziu cerca de 28
bilhões de litros de etanol nesta última safra (2010/2011). Nos EUA o volume já
ultrapassou 50 bilhões de litros. Incrível. O país que inventou o Proálcool,
obtido a partir da cana-de-açúcar, está tomando poeira dos gringos, que destinam
40% de sua safra de milho para a fermentação alcoólica. Mais ainda. A
necessidade de manutenção de estoques confiáveis começou a exigir volumosas
importações de etanol. Sabem de quem? Dos norte-americanos, claro. No ano
passado, o Brasil comprou acima de 1,1 bilhão de litros de etanol dos EUA.
Acredite se quiser.
Não é à toa que paira
desilusão no setor sucroalcooleiro. Estimulados pela agenda da economia verde,
nos transportes viabilizada definitivamente com a geração dos motores flex
fuel, inéditos e fortes grupos, nacionais e multinacionais, entraram na
atividade. Anunciaram planos formidáveis que, após quatro anos, micaram,
roubando o fôlego do parque alcooleiro. Notícia ruim chega dos canaviais. E quem
pensa que é chororô de usineiro se engana feio. Corretores garantem que 20% das
usinas do Centro-Sul estão à venda. Sem comprador. As chamadas greenfields,
novas plantas a serem construídas, em vários Estados, ficaram no papel. O pouco
dinamismo existente advém da ampliação e modernização de fábricas já instaladas.
Passos de tartaruga no etanol.
Milhares de estudiosos,
ambientalistas e jornalistas se encontrarão logo mais na Rio+20. O governo
brasileiro fará ginástica para justificar o inexplicável. Enquanto as nações se
debruçam para encontrar soluções capazes de esverdear sua (suja) matriz
energética, por aqui se desperdiça uma oportunidade de ouro, retrocedendo no uso
do combustível renovável.
Os produtores de
cana-de-açúcar e os usineiros de etanol, por sua vez, lançaram por aqui o
Movimento Mais Etanol, querendo influenciar a mídia e sensibilizar o governo
para sua agenda. Eles se propõem a dobrar de tamanho até 2020 - o que, ademais,
geraria 350 mil empregos diretos -, mas precisam viabilizar uma estratégia de
política pública que devolva ao etanol a competitividade roubada pelo controle
dos preços da gasolina. Basta, de cara, reduzir a carga tributária sobre o
biocombustível.
Gasolina barata e etanol caro
acabam criando um círculo vicioso contra o meio ambiente, prejudicando a saúde
pública. Segundo a Agência de Proteção Ambiental norte-americana (EPA, na sigla
em inglês), o etanol derivado da cana-de-açúcar pode ajudar a reduzir até 91% o
efeito estufa da Terra, quando comparado com as emissões advindas da queima de
gasolina. Mas, curiosamente, o ambientalismo pouca bola dá para essa tragédia da
poluição urbana. O foco de sua ferrenha atuação, conforme se verificou na
questão do novo Código Florestal, mira no assunto da biodiversidade. Contra o
desmatamento.
A intolerância dos
ambientalistas agride os agricultores, como se do campo partisse todo o mal
contra a natureza. Citadinos, eles poupam as desgraças ecológicas provocadas
pela urbanização, a começar pelos escapamentos veiculares. Novos estímulos
públicos ao setor automobilístico favoreceram agora as montadoras. Nenhum
compromisso ambiental se firmou. Pouco importa, tristemente, aos radicais
verdes.
Tal miopia do movimento
ambiental, infelizmente, ajudará o governo a esconder, na Rio+20, o retrocesso
na agenda do etanol. Seria interessante, aliás, como subproduto da reunião,
discutir para onde caminha o ambientalismo brasileiro.
A incrível capacidade
fotossintética do Brasil garante enorme vantagem na produção de biocombustível,
energia renovável misturada com geração de empregos. Desprezá-la significa
maltratar o etanol, um filho da Pátria.
Xico Grazinao autoriza e colabora com o BLog da MiraTerra
* AGRÔNOMO, FOI
SECRETÁRIO DE AGRICULTURA E SECRETÁRIO DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO.
E-MAIL: XICOGRAZIANO@TERRA.COM.BR
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